sábado, 15 de outubro de 2022

o sumiço dos gatos

 o sumiço dos gatos




De uma ora pra outra começou a sumir os gatos da vizinhança e vieram as acusações de que tal vizinho tinha dado veneno, ou atirado todos na sanga. Alguns até teriam visto o malfeitor. E assim estava estabelecido o terror. Havia um serial killer de gatos na cidade. Muitos até desistiram de comer os tradicionais churrasquinhos na madrugada ou aos domingos no campo de futebol. Um senhor que vendia peles e carnes de coelho foi para a inquisição dos fofoqueiros da pequena cidade. Nada foi provado, mas seu negócio de peles para gorros, cobertores e casacos para as madames faliu. Ninguém tinha a certeza da procedência do coelho assado vendido aos domingos pela esposa do peleiro curtidor.


Assim correu a fofocaiada que nem poeira ao vento levada pelo minuano. E o sumiço dos gatinhos não parava. Chegou a informação pelo rádio, bem cedinho de que na cidade vizinha também os felinos domésticos estavam desaparecendo. Mas estavam deixando os de pelagem escura e parda. Só os branquinhos eram levados, destes gatos que de longe parecem coelhos.


O comissário de polícia foi até a telefônica municipal e tentou falar com a capital sobre o assunto. Não conseguiu completar a ligação. Era uma chiadeira que não se entendia nada. Aproveitou atravessar a rua e entrou nos Correios. Mandou um telegrama para a chefatura de polícia.


Acusamos aumento de assassinatos de felinos. Reforços urgentes. No aguardo de providências”. Uma semana após mandar este telegrama, o comissário estava na delegacia e ouviu uma movimentação fora do comum. Estacionaram cinco jipes com policiais civis e brigadianos fortemente armados. Entraram na delegacia, uma casa de madeira alugada com algumas goteiras e muitas paredes roídas pelos ratos, afinal diz a lenda que quando “os gatos saem os ratos fazem festa”. O comissário explicou a problemática que estava tomando conta da região.


O chefe da policiada tomou a liderança e determinou ações. Vasculharam cada casa suspeita e indivíduos que poderiam ter o perfil. E acabaram descobrindo até um dono de bar na zona do meretrício que vendia um apreciado  churrasquinho de paca, que na verdade era carne de gambá.


Passaram três semanas e nada da descoberta sobre o assassino de gatos. A força tarefa foi desfeita e os brigadianos e investigadores da capital voltaram a Porto Alegre.


Uns dois meses depois o comissário recebe denúncia de que havia forte cheiro de podridão em uma casa abandonada, que tinha sido de um homem idoso recluso e que pouco se sabia. Haviam comentários de que foi muito rico e avarento. Ganhou dinheiro como balseiro no rio Uruguai, também explorou muita gente nas jazidas de pedras e até de ouro que se achava no Alto Uruguai. Não gastava, não saia de casa. 


Chegando na propriedade, se longe sentiram o cheiro de carne podre. 


  • Sinto o cheiro da morte- sentenciou o comissário que valentemente abriu o portão e seguiu a passos largos e firmes pela entrada cercada de palmeiras. O cheiro era insuportável, Vários cadáveres de pequenos animais jogados no terreno. Ouviu sussurros e deu meia volta. Pensou em pedir reforços. Tirou o Taurus 38 da cintura, certificou que tinha balas no tambor. Mas imaginou que pelo ocorrido precisaria de água benta e um ramo de oliveira. O caso era de sobrenatural. Se aproximou e viu um sujeito de aproximadamente 30 anos resmungando algo como : “ o tesouro é meu, o tesouro é meu”. Correu para o carro e na estrada encontrou o leiteiro que estava fazendo entregas. Pediu ajuda. Chame o Samdu urgente com camisa de força, ordenou. Assim foi feito.


Chegando a ambulância do Samdu - Serviço de Assistência Médica e Domiciliar, que havia antes do Inamps, INSS e SUS, se aproximaram e recolheram o vivente que só repetia: o tesouro é meu, o tesouro é meu”


Horas depois se desfez o mistério com o depoimento do serial cat killer.


Ele queria o tesouro escondido na velha casa do ermitão, pois a avó dele contou a lenda e que para achar o tesouro deveria adentrar pelo caminho ladeado de palmeiras com uma parelha de gatos brancos, unidos por uma canga de marmeleiro. Em determinado horário da noite os gatos brancos iriam reluzir com o brilho da lua e indicar o local do tesouro.  


O tesouro não foi encontrado, o caçador de tesouro foi internado, a casa está no mesmo lugar e ainda hoje se ouvem barulhos estranhos e miados fortes, principalmente quando o vento sopra em direção a cidade. 


Quem tiver coragem pode se aventurar na busca do tesouro, mas deixe a lenda dos gatinhos de lado.