quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Confundido com um caboclo namorador de São João do Itaperiú



Na última semana eu estava entrando em um supermercado e no alto da escada rolante um velho amigo me vê, para e me espera para me cumprimentar e conversar. A conversa agradável de tempos em que trabalhávamos juntos.


E volta e meia, durante a prosa em pé mesmo no alto da escada,  ele me aconselhava a voltar para a “loja” que eu não deveria abandonar, que eu repensasse. Assim percebi que ele estava me confundindo com outro caboclo que de vez em quando me confundem com ele. eu só queria o patrimônio e a conta bancárias deste outro. Não esclareci na hora, pois seria indelicado lembrá-lo que eu sou o Benhur, jornalista e não o caboclo de São João do Itaperiú que tem um colchão cheio de notas de 200 e que frequentava a “loja”. Nos despedimos e segui para as compras, mas fiquei lembrando de um episódio que envolve o vivente que confundem comigo.


Este personagem quando jovem morava na Boa Vista. Sujeito forte, com um metro e sessenta e cinco de altura era forte como um cepo de angico. Acostumado a ombrear sacos de cimento na loja do pai. Com uns 15 anos era o terror alí perto da rua São Miguel no Boa Vista. Brigava, arrumava encrenca e não perdia uma briga.


Certa vez ele e mais dois amigos resolveram que tinham de ir na soiree do Salão Jacob, no Piraí, conhecer umas “alemoa”. E se foram de bicicleta pelo Boa Vista, atravessaram o centro, pegaram a rua 15 e foram em frente.Com a vontade de chegar percorreram os 20 quilômetros em cerca de uma hora não dando folga ao pedal.


Chegaram no Salão Jacob, o baile estava fervendo na tarde de domingo. Deixaram as bicicletas ao lado, ajeitaram as roupas, tiraram as borrachas da perna da calça que se usava para não enroscar na corrente e nem sujar de graxa as pantalonas novas. Espelhinho, pente no cabelo, desodorante que traziam numa sacola de mercado. Se achavam o galã da novela. 


No salão a alemoada bailando com um conjunto afamado da região. Um bandoneon, bateria, baixo, guitarrista e outro com um instrumento feito de lata de margarina Primor, uma haste de madeira, cordas e que tocava com um serrote. Era tudo festa. Chopp bom feito em Joinville e uma cozinha de dar água na boca.


Os galãs do Boa Vista já espicharam os olhos para as “alemoas” e sem cerimônia começaram a tirar as moças para dançar. rodopiavam no salão, trocavam de prendas e assim se foi até que cada uma se afeiçoasse a cada um deles. Lá pelas seis e meia da tarde, meia hora antes de terminar o matinezão já estavam apaixonados e convidaram as moças para dar uma volta ali pela região para se conhecer melhor.


Os três mosqueteiros do Boa Vista saíram do Salão Jacob e tiveram uma recepção bem forte. Os “alemão” não gostaram de ver os caboclos cortejar as moças do Piraí e o paredão todos com braços cruzados e sem caras de bons amigos parecia o intransponível muro de Berlim.


Um olhou para o outro e cochicharam. No três corremos pegamos as bicicletas e vamos sair daqui.


Assim fizeram, só que as “zikas” as estavam com os pneus vazios. Sem chance de fuga. O mais esperto, aquele que me confundem às vezes gritou Macaco, Tomaz corre que tá ruim para nós.


Pegaram a Estrada Comprida e sumiram na braquiária. Pararam a corrida já perto do posto de gasolina no final da rua 15 no bairro Vila Nova, respiraram e voltaram a pé. Após quatro horas de caminhada de volta, pela meia-noite chegaram em casa no Boa vista. Quietos, cada um na sua casa foram dormir. No dia seguinte o pai do vivente perguntou:


  • E a bicicleta nova que te dei?

  • Não sei, Ontem estava aí. Acho que algum alemão levou, respondeu e já falou para o pai que tiraria uns dias de folga para visitar os parentes em São João do Itaperiú. Assim se foi e ficou uns 15 dias até baixar a poeira, se recompor e saber o que faria para comprar outra bicicleta. Voltar ao Piraí para buscar estava fora de questão.


As bicicletas dos malevas? Parece que foram usadas para a “alemoada” construir uma “centopéia” de bicicletas para os desfiles.


Os namoradores do Boa Vista nunca mais foram vistos nas soirées por aqueles lados.


sábado, 9 de setembro de 2023

A poderosa Isis

 





Era uma manhã de sábado em outubro de 2006.  Fui na Agropecuária 15 comprar ração para tartarugas e pássaros ao ar livre e para a Athena, uma pinscher que já tínhamos.


Logo na entrada havia um cercadinho de tela com vários filhotes para adoção. Peguei a Isis, uma cachorrinha de pelagem preta e trouxe para casa. Era um presente para meu filho menor Victor. Chegando entreguei a nova amiguinha e falei que eram duas irmãs gêmeas. Peguei a pretinha e lá ficou a marrom. Ele argumentou, com seis anos, que era injusto separar as irmãs; Voltei rápido na agropecuária e por sorte a marrom ainda estava lá. Trouxe também.Ela poderia ter cativado outra pessoa, com seu olhos cor de mel,  neste pequeno tempo que me desloquei de ida e volta.


Os irmãos Victor e Arthur as batizaram de Diana, a Rainha Guerreira (marrom) e a Isis, Poderosa Isis, a Deusa da Fertilidade na Mitologia egípcia que espalhou pelo mundo greco-romano.


Nos últimos tempos, já com quase 17 anos, o  equivalente a serem idosas, se comparadas a humanos, já apresentam sinais de demência, dificuldades de andar, de se alimentar e mesmo com todos os remédios e internações e cuidados, o ciclo da vida se encerra.


Diana já foi. Depois foi o Francisco que também subiu aos céus. E por fim a mais doente, a que mais tomou remédios foi a que viveu mais.


Isis nos deixou na noite deste sábado. Cansou de sofrer. Deixou de viver às 22h45min. Deu e recebeu muito amor. Ficam as lembranças pela eternidade.


N: 5/10/2006

M: 9/09/2023


domingo, 3 de setembro de 2023

Um homem sem pecados


Dias atrás encontrei um padre amigo de longa data. Conversamos sobre situação atual, amigos que se foram e lá pelas tantas ele me questionou:


- Faz tempo que não te vejo na missa.

- Pois é Padre, é que tenho ido em concertos matinais aos domingos e a efervescência cultural me atrai e não tem nada de pecado.

- Mas o encontro com o Senhor para agradecer e ter sua alma mais leve é um compromisso que não pode procrastinar. Insistiu o padre que estudou e trabalhou no Vaticano, ou seja, bem pertinho do argentino que tem conversa direta com São Pedro e com o chefão.


- Meu querido padre, irmão e amigo, eu já fui absolvido de  meus pecados há muitos anos e por toda a eternidade – argumentei.


- Mas de que jeito, você é um santo, então?

- Nem precisa se preocupar e nem abrir processo de beatificação. Já lhe asseguro que todo mal que fiz foi perdoado antecipadamente.


O padre deu uma gargalhada e ironicamente perguntou:

- Quais dos dez mandamentos você pecou, meu filho? Falou em tom de brincadeira, mas com ponta de seriedade como se estivéssemos em um confessionário.


- Pois olha, para o senhor posso falar, mas não espalhe. Todos os dez e ainda repeti alguns mais vezes. 


Outra gargalhada do sacerdote, que me abraçou e brincou. São mais de mil anos de penitência...


- Já fui perdoado pelo pela eternidade e quando eu chegar às portas de São Pedro, ele vai acessar meu arquivo, verificar a vida pregressa e me dar o crachá com livre trânsito.


Nova gargalhada do padre e ficou curioso com o perdão que recebi antecipadamente, de onde eu tirei isso. Afinal do Direito Canônico nada fala disso, nem encíclicas. Nada! Daí expliquei.


-É que nasci prematuro, feio, magro, doente e pobre, num lugar muito distante, num galpão que se parecia um manjedoura. Me levaram para um povoado onde havia um farmacêutico que atendia como doutor. Lá deu o diagnóstico:


- Não passa dessa noite. Procurem um padre para encomendar a alma deste anjinho e cavem um buraco para enterrar. Correram atrás de um padre conhecido que veio, na gélida madrugada de maio.


- Eu te absolvo de todos os pecados, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Com este sacramento, já fui absolvido por toda a vida.


Ficou sério. Perguntou se a prosa era verdade. Jurei que sim, afinal, eu não brincaria com coisa séria.


- Quero te ver domingo na missa das 10h. E não falte! Me deu um abraço e seguiu  seu caminho.


Hoje é domingo. Tem missa às 10h e concerto matinal às 10h30min com orquestra e coral na Casa da Memória. E se o padre não me ver na missa? Vai que ele dá uma conversada com São Pedro e revoga minha imunidade?


Melhor não arriscar né?