domingo, 6 de outubro de 2024

AMOR DE FILHO

Na semana que passou encontrei casualmente um conhecido de mais de quase 25 anos. Sempre que me via gritava na rua “seu Benhur vou passar lá!”, referindo-se a Prefeitura. E passava, tomava um café, conversava e agradecia pelo que eu havia feito por ele. Há alguns anos eu estava em Piçarras, sentado em uma cadeira na praia e ouvi seus gritos. Todos olharam e lá veio meu amigo fazer festa por ter me encontrado. Fiquei meio envergonhado, mas o recebi e conversamos um pouco.


Há uns 15 anos ele me apresentou a mãe dele. Todo feliz no supermercado, me perseguiu pelos corredores até me achar.


  • Seu Benhur esta é minha mãezinha. Ela queria te conhecer. Falei para ela do senhor.

  • Prazer, e obrigado pelo que o senhor fez pelo meu filho, agradeceu a senhora, bem vestida, elegante, educada com bom linguajar. Nem parece mãe de meu amigo que nasceu um pouco “atrasado” e “devagar”, mas com inocência, simplicidade e pureza de sentimentos. Alguém sem maldade e que luta todos os dias para sobreviver em um mundo desgraçado e cheio de gente preconceituosa, que fecham as portas para pessoas que têm alguma dificuldade.


Eu nada fiz de especial para o filho da senhora. Apenas tratei bem com respeito e dignidade e dei oportunidades de trabalho em campanhas eleitorais que eu estava envolvido em anos passados.Esta oportunidade, para ele, tinha uma importância enorme. Sentia-se parte integrante da vitória ou da derrota. Estava inserido em algo que ele julgava importante. 


Mas no encontro que tive com ele, perguntei o que andava fazendo:


  • Seu Benhur, estou estudando.

  • Que bom, mas o que você está cursando? questionei.

  • Estou estudando para ser cuidador de idosos.

  • Vai mudar de profissão?

  • Não, seu Benhur, vou cuidar da minha mãezinha. Ela precisa de mim. Está velhinha. vou cuidar dela.


Perguntei se ela morava ainda no mesmo local, no ateliê de pinturas onde ela foi artista a vida toda.


  • Sim seu Benhur, vai lá em casa ver minha mãezinha. Faço um café para o senhor.

  • Claro, meu amigo, vou sim. 

  • Eu vou para aula, seu Benhur. Não posso me atrasar.

  • Claro, vai lá, não se atrase e capriche, estude direitinho. E assim nos despedimos.



Com a voz embargada, quase não consegui dizer tchau e fiquei olhando ele apressar o passo, tirar o boné surrado para entrar na escola, segurando uma pastinhas com as lições. Ele, como sempre estava feliz, sorridente, talvez nem tenha noção de seus problemas. Quando ele me falava que fulano x ou y não o atendia e somente eu o recebia, eu falava que devia ser porque essas pessoas não sabiam do valor dele. Agora terá um diploma, conhecimento e vai cuidar da mãezinha até os dias finais. Estará feliz, realizado em dar retorno para quem lhe trouxe ao mundo, mesmo sendo um mundo cruel.