domingo, 30 de julho de 2023

O Amigão se foi

 



Há duas semanas estávamos na mesma mesa. Naquela  sexta-feira ele me atraiu com uma fotografia, enviada pelo whatsapp de um belo corte de carne de ovelha. Sabedor de que eu gosto, não tive como recusar o convite para ir no batizado da netinha dele, a Maithê.


Assim ele era, um sujeito bonachão, brincalhão e amigo de todos, por isso todos o chamavam de Amigão. Convivemos por décadas, principalmente após eu me mudar para Santa Catarina, em 92 quando eu comecei a trabalhar em A Notícia, morando em Joinville, nos finais de semana de folga eu ia para Itajaí, na casa da minha irmã Selita e de meu cunhado Idalécio. Lá sempre fizeram de tudo para que eu me sentisse acolhido. Eu já era parte da família dele, também,  com os pais, irmãos e tios. Eu era um novo agregado.


Era transparente, gostava de pessoas e ajudava os menos assistidos. Fazia “churrasco” de peixe charutinho na rua para a vizinhança. Sempre pronto para um passeio.  Era o tipo que tirava sua camisa, seu casaco para cobrir outro com mais necessidade..


Enfrentou dificuldades durante a vida, porém superadas com a alegria, otimismo e fé que sempre teve. Não perdia a Romaria de Santa Paulina e missa aos domingos. Sua fé ajudou a sobreviver ao câncer.


Mas sua paixão por motocicletas foi também o encerramento de sua alegria viver..


Sempre vou recordá-lo com muita gratidão e carinho e sua voz não vai sair de meus pensamentos quando me convidava para um almoço de domingo no fogão à lenha onde fazia suas comidas, suas frituras de peixes e bolinhos. Também tinha um pedaço de ovelha para me atrair.


  • Tchê! Olha só a ovelhinha que tem para ti.


É claro que eu iria, pois a companhia dele era insuperável.


Cultivem seus amigos, visite-os, compartilhem, pois a vida é muito curta, incerta e imprevisível.


quarta-feira, 26 de julho de 2023

Thomas e seus amigos

 Thomas e seus amigos poderia ser a locomotiva do desenho infantil que fez muito sucesso nos anos 80, ou então o simpático “Chefe do Trem” turístico que liga Hansa Humboldt a Rio Negrinho. E Thomas podem ser todos que gostam de trem, seja de brinquedo ou de verdade.


Ao embarcar na estação de Corupá, apreciando a beleza do morro Lombo do Boi,  recordo meus tempos de infância, em Erechim, quando era possível uma criança de 10 anos sair sozinha e ir até o centro caminhando e voltar em segurança. Subir a Serra do Mar na locomotiva alimentada a madeira era como subir a rua Itararé perto da minha casa para ir até o centro, pouco mais de 700 metros até chegar ao topo do desejo: a vitrine da Plasticolândia. Era um verdadeiro tesouro. Vitrine colorida, iluminada, com os brinquedos mais esperados em datas especiais. Desde o mais simples até Autorama e o inesquecível Ferrorama que ficava ligado como atração. Ficava um bom tempo olhando o trenzinho rodar.


A Maria fumaça com sua velocidade de 25 km/hora queima madeira e briquete para esquentar a caldeira, ferver a água e com o vapor girar os pistões e suas toneladas de aço montanha acima. Assim desbravaram a floresta, criaram cidades e o progresso e evolução abandonaram as marias fumaças. Suas paradas na subida da Serra do Mar são para recuperar o fôlego. Enquanto isso dá para apreciar as lindas montanhas como a do Lombo do Boi, Rio Vermelho, Morro da Igreja, Rio Natal e  a vegetação rica da Mata Atlântica e a beleza das bromélias e orquídeas e imensas plantações de banana, que os habitantes locais testemunham ser a melhor do Brasil.


A subida da montanha nos revela a imensidão do vale verde que encanta e o silêncio que se faz em cada espera é impagável, pela tranquilidade, pela harmonia. Dá para ouvir o zumbido das abelhas que polinizam e os borrachudos que se alimentam do sangue dos viajantes.


A passagens dos túneis escurece e enfumaça roupas e cabelos, mas logo se vê a luz no fim do túnel. A altitude de 850 metros até chegar no topo da serra é feita em degraus serpenteando a montanha que nos mostra obras de arte em cada quadro, em cada ângulo das montanhas, vales, travessias. E a locomotiva dos anos 50 restaurada puxa os quatro vagões internacionais fabricados nos Estados Unidos, França e Brasil. Segue em seu ritmo cadenciado: café-com-pão/café-com-pão/ café-com-pão.


No alto da montanha fica a localidade de Rio Natal que oferece uma bela visão do imenso vale coberto pela natureza intocada. Locomotiva sendo reabastecida com água e lenha na caldeira para mais uma etapa da serra até chegar ao topo, enquanto isso os passageiros aproveitam o farto almoço à vontade e se preparam para mais um trecho morro acima. 


Na minha infância, na vitrine da Plasticolândia ficava em pé admirando o trenzinho elétrico e também sentava na calçada e ficava imaginando cenários por onde passaria meu trem. Uma festa em cada estação, com gente indo e voltando, carregadores, moças abanando lencinho dando Adeus aos rapazes que iam para os quartéis da fronteira para prestar serviço militar, mães chorando porque os filhos iriam ficar um ano fora sem muitas notícias, pois dependiam de cartas.


A Maria Fumaça segue e o Chefe do Trem, o simpático Thomas e seus amigos informam que a próxima parada é na Estação da Música, junto à estação ferroviária em Serra Alta, já em São Bento do Sul. Lá há um grande acervo da tradicional Banda Treml. Parada para obter cultura, fazer um lanche com deliciosos quitutes e esperar a locomotiva encher os pulmões de vapor para seguir rumo a Rio Negrinho, no último trecho da viagem.


Comprei um copo de quentão e um pé de moleque, um agradável cão caramelo simpatizou comigo e sentamos na calçada. Dividimos o pé de moleque, cortei em pedacinhos pequenos e dei em sua já boca sem dentes. Gostou do docinho. Comprei mais um e dei aos pedacinhos. Agradecido abanou o rabinho ao se despedir de mim. Certamente nunca mais o verei, mas me fez companhia na parada da estação.


Piuíiiiiii!  Piuíiiii! seguiu a Maria Fumaça ao destino final: café-com-pão/café-com-pão/café-com-pão.