Foram horas tensas, com olhares reprovadores, comentários ao pé do ouvido, sussurros silenciosos e olhares amedrontadores. A cada passo daquele senhor, era acompanhado com desconfiança e com temor, afinal o que é aquilo em sua mão?
Na hora do embarque, foi o único a ser requisitado o código QR e os seguranças pediram que mostrasse em mais detalhes o que levava na mão. Ao entrar na área de embarque continuou a situação difícil.
- Como deixaram passar? Questionou uma mulher de uns 30 anos ao seu acompanhante.
- Acho melhor trocar a passagem, vamos em outro horário. Ponderou.
- Mas vamos perder a festa. Disse ela segurando um sacolão de roupas.
- Cuidado! Alertou o homem. - Nem vamos dormir. Cada hora um fica acordado, sugeriu.
- Combinado, concordou a mulher.
Todos acomodados em suas poltronas, poucos arriscaram ir ao banheiro no final do corredor do ônibus. Temiam o sujeito suspeito com aquilo nas mãos.
Motor ligado, ar condicionado acionado e o motorista deu partida sem antes ser questionado como a companhia permitia tais passageiros.
Ele comprou pela internet e o nome dele está na lista, concluiu o chofer.
Durante 16 horas de viagem, todos estavam tensos, cada qual fuçando em seu celular. Vendo filminhos adultos, jogando tigrinho e fofocando com os conhecidos, mas com o canto de olho no perigoso passageiro que insistia em ler um livro, sim livro, daqueles impressos em papel com boas histórias e que transmitem conhecimentos durante séculos.
O idoso nem deu bola, continuou a ler, cochilava um pouco, voltava a leitura e nem conhecimento tomou dos olhares condenatórios.
Este idoso era eu, que durante a viagem consegui ler “As Cataúchas do Lima” um compêndio de suas crônicas. Parabéns ao Liminha pela iniciativa e por perpetuar a arte gaúcha e principalmente o livro físico, impresso que dá gosto folhear, marcar as páginas, retornar a leitura.
E neste feriadão leiam um bom livro e larguem de mão desta porcaria de celular que torna uma nação cada dia mais atrasada culturalmente.