domingo, 23 de fevereiro de 2025

MARISCADA AFRODISÍACA


Na lousa montada sobre o  cavalete na calçada do bar estava escrito: Hoje mariscada afrodisíaca. Apenas 10 pilas a bacia.  Como é de costume, um grupo de amigos que se reúne sempre no mesmo lugar, combinaram de ir comer o tal marisco e beber algumas cervejas na noite quente de quinta-feira.


Neste bar, o bolicheiro faz costelada, dobradinha, linguiçada e outras comidas de boteco. Higiene do banheiro nem é bom comentar, imagina onde a comida é feita. 


Quando o grupo chegou lá pelas seis horas da tarde, chamaram o dono do bar e pediram para início da reunião seis bacias de bom marisco com propriedades sobrenaturais de ressuscitação. Só que a decepção foi grande. Havia acabado e só tinham duas marmitas guardadas e já pagas antecipadamente.

    - Ué! O que aconteceu: Está ali o anúncio e viemos experimentar o milagroso marisco. Questionou um dos colegas.


    - O amigo de vocês veio mais cedo, devorou o estoque, comprou duas marmitas que estão guardadas para ele levar e atravessou a rua, explicou o dono do bar apontando para uma casa de tolerância ao lado do posto de gasolina e tradicional na cidade. Saiu daqui garganteando que hoje vai passar o rôdo.

    - Ficamos muito putos da cara com o sujeito, que se adiantou na poção e foi se divertir na casa que tem pelo menos de 40 a 50 recepcionistas belas, bem arrumadas, agradáveis e caras. Para frequentar tem que ter tufo na guaiaca, como diz um renomado arquiteto conhecido nosso.


O grupo ficou por ali, uns pediram amendoim, outros batatinhas fritas de pacote e cada um bebericou a bebida de sua preferência. Uns minutos mais tarde deu movimentação na casa. Uma ambulância entrou rapidamente e o sexto sentido do grupo deu o alerta.


    - Deu merda com o fulano, vamos lá.. Correram e lá chegando estava o vivente sendo atendido pelos socorristas. Estava com o soro e sendo levado ao Pronto Socorro. 


A dona casa falando grosso já intimou:


    - Vocês são amigos do fulano? Tratem de pagar o que ele ficou devendo e limpar esta vomitança toda de marisco que ele fez. Uma das hostess estava fantasiada de marisco, salsinha, cebola, cheiro de molho com ácido de vômito. E esbravejando sem parar.


    - Madame. Não conhecemos este senhor. corremos aqui porque vimos a ambulância chegando e poderia ser algo grave, respondeu o mais velho e ladino do grupo e já foi retirando o grupo da casa, antes que dona, muito esperta atravesse a rua e pergunte ao bodegueiro.


Deve ser lenda urbana ou litorânea esta de que o marisco faz milagres…Deu congestã..




quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

A PRISÃO DO NÔNO NA DELEGACIA DE CAXIAS DO SUL

Desde a madrugada pai e filho estavam sentados na calçada em frente a delegacia de polícia de Caxias do Sul, enfrentando o ar gelado e o vento. Esperavam a repartição abrir para falar com o delegado a respeito de uma injustiça e também visitar o detento, pois estavam com saudades. Desde a prisão do “nôno” suas vidas ficaram vazias. Não tinha mais graça colher a uva e pisar a fruta nas imensas gamelas para fazer o vinho.


Porco cane! Mas este tal de delegado “non vem trabaiá”. - Figlio di un rospo! Esbravejava o italiano agasalhado com um desgastado sobretudo de lã, fabricado  pela confecção Alfred, marca famosa na cidade. Lá pelas nove horas da manhã apareceu o delegado, um sujeito de fora, magrinho, de terno, gravata, bigodinho e chapéu de lado.


Um policial convidou pai e filho para entrarem, pois ali estava frio e em seguida o doutor delegado os atenderia. O policial conhecido ofereceu umas cuias de mate e umas cuecas viradas ou grostoli, como queriam, fritadas  na tarde anterior, que sobrou em sua casa e ele trouxe para a delegacia. Pouco tempo depois o doutor delegado pede que o cidadão entre para ouvir a reclamação,


  • Dotore, viemo ver o Nôno, uma visita e queremo que o senhor solte ele. Não fez nada. Non é criminoso, mas fica falando o tempo todo e nos diverte.


O delegado olhou, solicitou as fichas dos presos ao escrivão e não encontrou nenhum nôno, nenhum  idoso e ninguém estava preso na delegacia.


  • Meu senhor, deve haver algum engano. Não temos prisioneiros.

  • Tem sim! Prenderam lá fora na “colonha” e trouxeram para cá. Queremos uma explicasson, agora. É tudo culpa daquele Getúlio aquele disgraziato. Eu tô vendo o “nôno” ali no armário.

Com o rumo da prosa o doutor delegado entendeu do que se tratava.


  • Ahhh! Entendo sua preocupação, mas é ordem federal, e não posso liberar o prisioneiro. Senão eu vou preso e as forças nacionais me levam daqui. É que o seu nôno é altamente perigoso de acordo com os governantes da Guanabara. O delegado encheu mais uma cuia, comeu mais uma cueca virada e questionou:


  • Mas porque nôno!

  • É igual meu pai, falava o dia todo, reclamava, cantava, nos divertia, ia junto para roça, para o parreiral e de vez enquanto cochichava e trocava palavras depois de uns bicchiere di tinto.

  • Vou fazer um acerto com o senhor. vou liberar o nôno para visitar vocês em casa, mas quando o sargento for lá buscá-lo, favor liberar o prisioneiro para voltar para delegacia. De acordo?

  • Giusto e grazie!


Esta história é quase ficcional. Ocorreu em Caxias do Sul                                                                                                                                     e li durante visita no Museu Municipal sobre o confisco de rádios em colônias de colonização italiana em maio de 1945. Resolvi contar de uma forma diferente, mas parecida de como aconteceu para lembrar deste meio de comunicação que no último dia 13 de fevereiro se comemorou o Dia Mundial do Rádio.


E fica o convite para que ouçam a Rádio Joinville Cultural na frequência 105,1. Também estamos em plataformas de áudio e no streaming. Rádio Joinville Cultural.



sábado, 8 de fevereiro de 2025

ELA É MINHA

Quando a professora Inês desceu as escadas da faculdade, fez com todo cuidado, pois dia de chuva e piso molhado sempre há riscos. No último degrau o calçado e o piso tramaram contra ela e lá se foi para o chão. Torceu o tornozelo e se espalhou. Foi um corre corre dos colegas para ajudá-la. 


Rapidamente chamaram um professor doutor em fisioterapia para uma avaliação e saber o que fazer.


  • Professora Inês, há quanto tempo não vejo a senhora. Me deu aulas na quarta série. Vamos ver o que houve. O diagnóstico foi que seria melhor levá-la ao hospital pois o entorse precisa de faixas e talas para evitar a piora.


Chamaram o serviço de emergência dos bombeiros, e nova surpresa. O socorrista ao vê-la questionou:


  • Oi diretora, o que houve. A senhora não se lembra de mim? Tenho boas lembranças até mesmo de seus conselhos na secretaria. Mas vamos levá-la e tratar do tornozelo. E lá se foi a professora na ambulância dos Bombeiros até o hospital da cidade. O motorista da ambulância a cumprimentou, sem muito entusiasmo porque estava com a missão de levar a professora para um salvamento importante. Mas recordou. - A senhora antes de ser diretora me deu aulas, também. Chegando lá foi prontamente atendida pela equipe de plantão.


  • Olha só quem chegou! Exclamou a enfermeira chefe do plantão. Professora Inês, há quanto tempo? Veio nos visitar e nem temos um biscoitinho com chá para lhe oferecer, brincou a mocinha. Ela lembrou a professora de que foi aluna dela no curso de enfermagem, já na faculdade. Encaminhou aos procedimentos, feito o raio X, veio a médica plantonista com os exames, olhando contra a luz. Inês, olhou e viu que não era estranha aquela moça. Claro, frequentava sua casa, pois era coleguinha de seu filho, quando adolescentes. 


  • Mas veja só, quem aparece… Inês que bom que a senhora está aqui. Disse a médica plantonista. Mas corrigiu. Bom não é, mas sempre é bom rever pessoas que nos ajudam a construir nossas vidas e carreiras.  Enquanto a médica conversava explicando a situação de que havia apenas um rompimento de um tendão e assim inchou o tornozelo, o médico ortopedista chegou em seguida e já ordenou:


  • Deixe que eu assuma daqui.

  • Mas eu conheço a professora Inês há tempos..argumentou a médica.

  • Eu conheço há mais tempo ela me alfabetizou, respondeu o ortopedista em tom de brincadeira. 


Por algumas horas a professora Inês foi paparicada por seus ex-alunos, hoje encaminhados na vida. Mas fiquei sabendo deste causo porque a vi com uma bota imobilizadora ortopédica.


  • Boa tarde professora, virou criança com botinha Ortopé? Provoquei em tom de brincadeira. Ela me olhou, pensou e respondeu


  • Escute meu senhor. Não lembro de quem seja, mas é uma lesão no tendão e não sou criança para usar botinha Ortopé. Fiquei meio desconcertado com a resposta,mas ela emendou a prosa e me contou a história acima. Esclareci

  • Nós trabalhamos juntos  na Secretaria de Estado de Educação. Daí ela lembrou. Me despedi e a confortei:

  • Professora a dor vai passar e a senhora vai ficar com o pé novinho em folha. E com tanta manifestação de carinho, apreço e gratidão vai lhe fazer melhorar mais rápido. A senhora deixou muitas coisas boas em cada coraçãozinho dessa piazada que hoje estão encaminhados. Comemore isso. Me despedi e segui em frente. Dei uma olhadinha para trás e vi Inês secando lágrimas. Devem ser gotas de felicidade pela gratidão de seus ex-alunos.


 Não faço mais piadinha sobre botinha Ortopé. Mas o jingle era bonitinho. Era assim: Ortopé, Ortopé, tão bonitinho. Tênis e botinhas, sandálias, sapatinhos….