Caçadores de Velório
Já ouvimos falar dos Caçadores da Arca Perdida, Caçadores das Galáxias, Caçadores do Santo Graal, Caçadores de Emoção, Caçadores de Mentes, Caçadores de Recompensas. Tudo isto já foi eternizado por Hollywood em filmes, muitos de sucesso de público e crítica.
É que ninguém pensou em fazer uma produção sobre os Caçadores de Velórios. Isto mesmo. Lá perto de casa tinha uns quatro compadres que não podiam perder um velório. Era um evento social, diversão, passatempo, reencontro de amigos, conversa, chimarrão e era comum panelões de “brodo” em noites frias. Café a noite toda para velar o “santo” .Muitas vezes tinha roda de violão, cantoria, cachaça e vinho. E o morto? Solito no más, na sala, já que a diversão estava melhor lá no lado da casa.
Semana passada, falando com o tio Nelson Guimarães, comentei com ele, que os compadres não podiam ver um velório. Escutavam a Rádio Erechim para ver os avisos da Funerária Passuelo. Era mais ou menos assim que o locutor anunciava : “É com pesar que comunicamos o falecimento do fulano de tal, conhecido como cicrano. O Féretro está sendo velado em tal lugar e o corpo segue para missa de corpo presente tal hora. Depois será sepultado no cemitério municipal Haverá ônibus de ida e volta”. Sabedores do evento, estava pronta a caça ao velório. Como não havia telefones, era fácil caminhar até a casa ao lado ou próxima para avisar os compadres da novidade. Às vezes a piazada levava o recado.
Eram quatro cavaleiros do Apocalipse na minha quadra: meu pai o Fábio, o compadre Nelson, o Chiodi que morava ao lado e o Abrahão Aoach, da rua de cima. Abrahão era um judeu bem de vida, com duas lojas perto da rodoviária. Sempre de carro novo. Todo ano ia na Ford e pegava um Corcel estalando de bonito. Lembro de um modelo 75 branco com listras pretas no capô e laterais. Um luxo.
Numa tarde de sábado o Abrahão encontrou o Nelson Guimarães na rua Liberato Salzano, perto da escadaria e o convidou para um velório e já deu o recado. - Avisa o Lima também.
Guimarães queria mais detalhes de quem era o morto, afinal não tinha dado na rádio. Não ouviu nem o Jovino e nem o Tramotina falar nada. Na outra rádio o Jerônimo Nunes não irradiou também. Quem seria?
Mas Abrahão quem é o falecido? É conhecido nosso?
Não! Nem conheço, mas vamos lá quero aproveitar que tem bastante gente para vender um “fogon” a lenha usado.
Só restou ao Nelson dar uma risada. O judeu queria caçar um velório, de gente que nem conhecia para vender um fogão usado. Vai que alguém lá precisa.
Quer saber se foram?
Foram sim, afinal não tinha muito o que fazer num final de semana em Erechim. Velório era um acontecimento e não vão me acreditar, o Abrahão vendeu o fogão. Veio para casa com uns pilas no bolso.
Bom final de semana e escutem a rádio para ver se tem algum anúncio fúnebre. Numa noite fria certamente vão servir uma sopa bem quentinha e um brodo com caldo grosso. Se tiver algum com boa concorrência, café passado na hora e um caldo de galinha bem forte e quente,me avisem. Vai esfriar.