quarta-feira, 12 de abril de 2023

O gauchão de apartamento que se apaixonou pela equitação

 O gauchão de apartamento que se apaixonou pela equitação


Há um tempinho reencontrei um colega de trabalho, que nos conhecemos há uns 30 anos. Abraço cinchado, falamos um pouco da vida e o que aconteceu em três décadas. Depois de uma charla de meia hora decidimos ampliar as falas em outro dia. Me convidou para almoçar no domingo. Faria um churrasco gaudério.


No dia marcado fui no endereço do vivente por volta das 10h, esperando que o mate tivesse pronto e que já servido um martelinho de branquinha para tirar a poeira da goela.


Bati palmas, veio no portão e me atendeu, entramos na casa. Nada de mate, pois o sujeito acha que dá câncer na garganta, já que ouviu falar de uma pesquisa. Fiquei quieto e não toquei mais no assunto. Olhei em volta e nada de carvão, nem uma paletinha de ovelha. Muito menos um daqueles copinhos de vidro pequenos onde se coloca uma dose de cada vez e se mete nos queixos até não ficar uma só gota. Mas tem que ser “daquela que mata o guarda”. Já comecei a ficar preocupado.


O tal gaúcho, nascido na vila IAPI de Porto Alegre, se dizia torcedor do São José, clube do bairro e conta a lenda que teria a maior torcida do Rio Grande do Sul ganhando de Internacional e Grêmio. Mas não tem nenhuma foto e muito menos camiseta ou flâmula do tal clube do coração. Aí já minha feição começou a mudar. Eu já parecia um bulldog, ou “bordoga” como se diz lá fora.


Lá pelas 11h30min ele veio com uma garrafa toda enfeitada, para não dizer afrescalhada, com um tal de Gin e uma latinha de tônica. O domingo ficou torto. Gin com tônica. Bebida de gaúcho? Mas nem nos costados com a Argentina. Eu já meio vesgo e tonto de fome. Ele saltou com essa:

- Deixei o churrasco já temperado com um preparado que vi no programa gourmet. É só botar aqui na airfryer que fica prontinho em meia hora. Confesso que aí saltou os butiá dos bolsos. Pensei em como sair dali, imaginei se alguém me telefonasse com um assunto urgente. Nada.


Ajeitou duas linguicinhas, duas sobrecoxas de frango temperada gourmeticamente, conforme viu na TV. Era o churrasco gaudério do malandro do IAPI. Esperei a sobremesa, pelo menos uma ambrosia, um arroz doce. Nada. Apenas uma barra de cereais diet.


Mas o melhor veio de tarde. Me convidou para conhecer o estábulo onde guardava a égua de montaria que comprara por R$ 15 mil. Sua distração era nos finais de semana a montaria. Escovava a égua de pelo cebruno. Dava umas voltas e no final da tarde de domingo guardava a bicha que ficava sob os cuidados de gente que entende.


Mandou o pessoal encilhar a danada e trouxeram um banquinho para o gauchão, quase 60 anos e com uma pancinha avantajada subir na montaria e dar uma campereada. Quando vi lá adiante o sujeito pilchado, já na sela vindo devagar com uma cavalariça puxando a égua pela rédea até levá-lo a porta da estrebaria,  entendi o investimento, os cuidados e paixão repentina  pela equitação.


Estou até pensando em meter a mão na guaiaca e investir nessa diversão. A visão das cinco irmãs cavalariças que cuidam dos animais é uma visão mais bela que as dançarinas de can can do Moulin Rouge em Paris.


As cinco morenas de crinas negras, sedosas e brilhantes vestidas em jeans dois números menores, bem como as camisas de cowboys com botões a menos e lenço de seda no pescoço. Chapéu com barbicacho colorado e botas de cano alto trabalhadas com ornamentos e esporas de prata.


Só me restou parabenizá-lo pelo investimento, pelo belo animal e desejar que aproveite por um bom tempo. Me despedi e ao sair ouvi uma das moças que veio recolher o animal:


- Senhorzinho, posso levar ela para a baia?

- Pode sim. Por hoje chega.

- Vou buscar o banquinho para o senhor descer.


Sai antes de ver a cena. Melhor ter a visão de quando ele aguentava 90 minutos em campo e mais prorrogação. Mas pelo menos aguentou duas horas em um show de Rita Cadillac. Tirou fotos e recebeu beijinho no rosto. Prometeu deixar a marca do batom da Cadillac por um longo tempo. 



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