domingo, 26 de maio de 2024

Estão se indo, um a um



Estávamos em um bar, destes bem chinelão, à beira de uma avenida e perto de fábricas. Frequentadores gente de todo tipo, mas o ranzinza escolhe cada lugar que é pior que a cara dele.  Ele atrai só ziquizira. Do lado, sempre um casal de senhoras que namoram discretamente. Incomodado vira o focinho e resmunga. Já falei para ficar quieto. Tem um bicão contumaz que chega falante e coloca seu trago em cima da nossa mesa. O que me irrita, mas ele fez amizade e até uma garrafa de vinho chileno já ganhou do amigo de bar.


Mas como os membros do grupo não apareciam para a assembleia semanal, começamos a ver fotos no celular e insistir em convidá-los. E assim nos deparamos com a nova realidade. Estamos perdendo, dia a dia, os membros da confraria.


  • Perdemos mais um, comentei ao olhar a foto no Instagram.

  • Infelizmente, mais um que se foi. O “Urtigão” concordou, dando mais uma beiçada no copo de samba. O copo devia ter dezenas de digitais sebosas. Não sei se lavam direito. Imagino que passam uma aguinha e servem ali mesmo para outro cliente.


Comecei a pesquisar as fotos dos amigos do grupo para ver o que está ocorrendo.


  • Olha este aqui, bebendo vinho de boa qualidade, mostrando a adega climatizada na sala e a companhia dele. Nos trocar por isso? 

  • Este outro aqui, flagrado na cama do casal com duas. Vai dar encrenca.

  • Credo! Este não vem mais e está perdido. Nem queremos. Temos de tirar do grupo e riscar o nome, Bloquear, ou como dizem os jovens Cancelar.

  • Todos foram corrompidos e estragados pelo fulano, que faz um rabisco aqui, um desenhinho ali e depois que voltou de Nova Iorque, onde aprendeu esticar o mindinho para beber em taça de cristal, nunca mais se ajeitou. botou a perder quatro membros da confraria. Restam três ainda raiz que não nutelaram.


Ele concordou e até avaliou:

  • Ele que não venha para o meu lado que esta bandalheira. Você eu sei que não se entrega tão fácil e o mau humorado do Garcia, até onde sei não é de se chegar do lado avesso. Mas parece que a esposa tem forte influência, mas não tem fotos que o comprometa.


Fiquei pensando. Pedi mais uma Heineken, o velho mais um samba e ficamos calados por instantes até que ele se levantou, pegou a chave do carro e largou a bebida em cima da mesa, para alegria do bicão da mesa ao lado, pois em seguida pegaria o que sobrou.


Perguntei ao velho antes de ele sair: -  Ué, vai onde vivente: -  Vou me precaver, respondeu. Não acreditei. O segui e foi mais um que perdemos. Parei em frente a casa e lá estava ele dando alpiste para a passarinhada e leite integral para o gatinho. Pois é. Todos citados mantêm suas paixões secretas por seus gatos e cachorros, chegando ao abuso de cederem suas camas e sofás para a realeza. 


Acho que neste inverno não haverá assembleias da confraria. Vamos aguardar o esquentar da primavera.


terça-feira, 14 de maio de 2024

CAFÉ AQUÁRIOS E SEU MICROCOSMOS


Morei em Pelotas, no sul do Rio Grande do Sul de 1984 a 1989. Enfrentei o frio, a chuva, a umidade, tempestades, cerração e ruas alagadas, como é de costume; Mas nunca presenciei tal situação como está ocorrendo hoje. A água que destruiu grande parte do Estado está descendo pela Lagoa dos Patos e levando o medo, a tristeza, as perdas. Se lá morasse, eu seria um retirante, um atingido, pois meus antigos endereços hoje estão embaixo da água. Pessoas que pouco tem acabam perdendo tudo e tendo de  recomeçar. 


Mas recordo com carinho da cidade cultural, histórica, agradável, de gente bonita, fina, elegante e sincera como diria Lulu Santos em Tempos Modernos. Fui recebido de braços abertos, fiz amizades que ultrapassam 40 anos.


Cito o tradicional Café Aquários no centro de Pelotas, por traduzir o âmago da história, do povo,seus costumes, seus orgulhos e seu convívio social. Ali se encontram, se misturam, conversam, discutem os diversos assuntos, mas sem brigas nem alterações.


Se encostam no balcão do café e bebem um expresso, muitas vezes fazendo a gentileza de presentear o adversário. Se encontram Brasil e Pelotas, Grêmio e Inter, Arena e MDB, juízes, médicos, advogados, policiais, rufiões, agiotas, engraxates, bicheiros, jornalistas, radialistas, mecânicos, professores, gente do bem, gente do mal. Filhos de damas e filhos da outra.


Lembro com carinho do ex-prefeito Bernardo de Souza, que quando me encontrava no café me dava uma ficha para expresso e repetia: Mas você não envelhece. Eu apenas sorria e aceitava a fichinha.


Acredito que até hoje é este local ecumênico, onde todas as soluções do mundo passam por ali. Já se chamou Café Nacional, Café 35 e há 54 é Aquários devido as grandes vidraças. Quer ver e ser visto? Vá tomar um expresso, fazer um lanche no Aquários.


Tenho enviado mensagens aos amigos que lá ficaram. A maioria me responde que está bem, alguns que  saíram de suas casas, outros me relatam que levantaram os móveis. Mas o peito está apertado,  o temor continua e nada melhor do que dormir na nossa cama, com nosso travesseiro. 


Resta torcer, ter fé de que tudo passará rapidamente e que as cidades e as pessoas se reconstruam para retomar suas vidas. 


Em breve gostaria de voltar para beber muitos cafés no Aquários, reencontrar quem lá ficou e me esbaldar na Fenadoce. 



domingo, 12 de maio de 2024

O PRIVILÉGIO DE TER MUITAS MÃES

 



Avaliando estas seis décadas de vivência posso afirmar para a companheirada que fui um taura de sorte, abençoado por Santo Antônio e criado por várias mães. Nasci como um bezerro fraco que não iria vingar. Contam que me deram leite de cabrita para ver se firmava.


Mas o bugrinho foi pegando peso e hoje é melhor nem falar nisso, pois supera sete arrobas. E falar em mãe seria injustiça com as demais se eu citasse apenas uma. Tive várias, o que é um privilégio. Tive a mãe que me carregou sete meses Leonor, tive a tia que conheci como mãe Lili que me adotou, criou e encaminhou na vida, tive a avó Elvira que era a protetora. Quando a coisa ficava feia corrida para me esconder atrás da vó. Tive minha irmã e comadre Pepita, que quando nasci gastava seu dinheiro que ganhava como balconista para comprar leite especial para ver seu ganhava um corpinho. Mais tarde ela até tentou me matricular no Lar Escola, mas não durou a proeza. Fugi. Desconfiava que a professora iria comer minha merenda. Afinal eram especialíssimos merengues assados no forno do fogão a lenha, que ela fazia. Crocantes, deliciosos. Não iria deixar isso acontecer. 


Não poderia deixar de citar a Dona Setembrina, onde eu passava tardes inteiras quietinho lendo gibis. A caixa ficava embaixo da cama. Eu já sabia. Uma tarde fui ler gibis, ela saiu, foi ao centro fazer pagamentos e compras e quando retornou ficou assustada com a porta destrancada. Imaginou que haviam invadido. Nada disso. Era eu, bem  quietinho. Fiquei toda tarde lendo. Ela havia me esquecido dentro de casa. 


Na vizinhança havia muitas mães como a Moseca, a Palmira Galli, Tia Koka Motta, a Angela Tiburski, a Marlene Guimarães, a Iracema Chiodi e tantas outras. 


Em outra ocasião, até escrevi sobre o pão com molho que a vizinha da frente dona Palmira dava para o filho dela Paulo e para mim. Lá pelas 11 horas ficávamos rodeando na cozinha até que ela preparasse uma grossa fatia de pão assado no forno de tijolos, com generosa cobertura de molho da carne que estava preparando na panela de ferro  e saíamos correndo de novo. Era comum chegarmos na hora do almoço, sentar, comer sem cerimônia e sem convites na casa dos outros. Os vizinhos pareciam que eram todos parentes e nunca fechavam portas.


E as mães da rua sempre de olho vivo para proteger a criançada que brincavam até altas horas da noite. Muitos enforcavam o banho. 


São boas recordações de uma infância que deixou boas lembranças. E lembrar dessas mães também é uma maneira de homenageá-las.


Assim, parabéns para todas as Mães, seres acima do bem e do mal e com lugar garantido no Céu.


domingo, 5 de maio de 2024

Re leitura da música HORIZONTES

 Neste domingo reproduzo texto de autoria de meu colega de faculdade e amigo José Asunción Quevedo. Paraguaio de nascimento, gaúcho e brasileiro de coração e que mesmo morando em Assuncion, sobre pelos amigos que aqui ficaram e que hoje veem e vivem em um Rio Grande do Sul destruído pelas forças da natureza.;


Re leitura da música

 HORIZONTES 

 




E faz um curto tempo que quase ninguém  anda 

pelas ruas de um Porto que hoje  está  muito triste  e nada Alegre



Mas no entanto todos tem  esperanças que voltará a ter seus encantos


E os maravilhosos  pôr-de-Sol  novamente terão seus  versos


A população sairá com força e com mais coragem  lutando e reconstruindo  casas, escolas e muitos caminhos.



De novo a gente gaúcha estará arando terras, provando vinhos

Terão mais ideias para levantar suas cidades.

E o  amor  seguirá presente em todas as idades.


Chorando como o rio e com suspiros doloridos  farão que os moinhos de vento  soprem esperanças


Subirão de novo  no bonde,  e não descerão dos morros correndo  de medo , mas sim para ajudar a levantar paredes. 


A boa funda de goiabeira será  para espantar tragédias, 

Jogarão  bolitas de companheirismo, de Fé e de solidariedade.


Estarão perto das  fogueiras fazendo, pão, churrasco ou carreteiro


Quadrilhas de sessenta e quatro voluntários

talvez  sessenta e seis,  alguns somam sessenta e oito apesar dos dados de maus tempos, eles , firmes sempre fortes estarão por aí


Anos setenta, oitenta, noventa também custou pra ti e  passaram, mesmo sendo difíceis  foram vencidos


E neste 2024 ano por demais  complicado para o sul nada nada  fará perder vossa raiz . 



José Asunción Quevedo...


Mensagem aos meus queridos amigos gaúchos com quem compartilho desde anos  de faculdade assim para os novos amigos que a vida sempre nos presenteia.


A ideia deste texto foi resultado de uma re leitura  da música  HORIZONTES  com letra de Flavio Bicca Rocha   composta para a Peça teatral BAILEI NA CURVA (ano 83) e que foi um hino na minha época que morei no RS.



quarta-feira, 1 de maio de 2024

O CAMPEÃO DE NOIVADO NO EXTREMO OESTE

 


Nas minhas andanças por Toda Santa Catarina, principalmente em campanhas eleitorais, seja de Luiz Henrique ou Marco Tebaldi, encontrei muitos personagens. Fiz muitos amigos e conheci a maioria dos 295 municípios catarinenses.


Sempre tive preferência pelo Oeste e Extremo Oeste devido às particularidades, características e costumes, pois a maior parte é de gauchada que migrou. Gostam de churrasco, chimarrão, uma boa prosa, contar causos e torcem pelo Grêmio ou Inter e acompanham os jogos pelas rádios  Gaúcha e Guaíba.


Mas numa dessas andanças, lá por 2010, primeira vez que Tebaldi se elegeu deputado federal, estávamos percorrendo os municípios do extremo oeste. Saímos de São Miguel do Oeste e seguimos para Belmonte, Tunápolis, São João do Oeste, Itapiranga, Mondaí, Riqueza, Caibi, Palmitos e São Carlos.


Íamos parando em casa cidade, conversando com simpatizantes, em pequenas reuniões nas residências, algumas festas populares e em cada roteiro tínhamos um amigo correligionário conhecedor da região, das famílias e onde poderíamos ter uma prosa simpática.


Neste roteiro quem nos acompanhou foi um conhecido morador da região que em cada cidade que ele havia preparado a reunião, fazia a introdução do assunto, apresentava o Marco Tebaldi, que havia sido prefeito reeleito da mais importante cidade catarinense Joinville e que estava colocando seu nome para concorrer a deputado federal. 


Neste roteiro, pelo menos na metade das cidades ele fez questão de nos levar na casa dos sogros. Sujeito de boa fala, transpirava sinceridade em seu palavreado. Um artista de primeira grandeza.


  • Deputado (já antecipando a vitória que seria só em outubro), quero lhe apresentar a minha sogrinha querida, que é minha segunda mãe. Este é meu sogro, pai da minha noiva que é mais que um pai. E esta é minha noiva a quem lhe convido para ser padrinho do casamento tão logo seja possível Acho que dá para esperar sua vitória para fazer uma festa mais bonita.


Assim foi com esta prosa em metade das cidades. Findo o roteiro,nos despedimos da equipe local e seguimos para Chapecó para dormir e no dia seguinte voltaríamos a Joinville. 


Na volta Tebaldi comentou:


  • Este Rei do Noivado vai custar caro, imagina presentes para seis ou sete casamentos……

Como diriam em algumas regiões: O cara é penteado. E até esta semana, falei com ele, continua noivo agora em 8 cidades. Domina o extremo-oeste. Acho que está morando em Mondaí.