Eu era bem pequeno, e naquela tarde de sábado ouvimos uma fanfarra ao longe e corremos para a rua. Toda piazada ficou “bombeando” um grupo vestido de vermelho, com bandeiras e tocando tambor. Era a tal TFP-Tradição Família e Propriedade fazendo uma marcha pelas ruas de Erechim. Não entendíamos nada daquilo.
Mais tarde naquela noite haveria uma cura milagrosa na Praça da Bandeira. Mistura de charlatanismo com diversão. Novamente minha irmã Pepita e meu cunhado Pedro me enfeitaram, e fiquei mais bonito que criança em dia de batizado, pois ainda não tinham filhos e me levavam passear. Estava todo enfatiotado para ir ao Café Grazziotin, depois um passeio para ver as vitrines das lojas e por fim na praça que lotava de curiosos. Vizinhança toda ia, afinal na época, aparelhos de TV eram raros nas residências e atrações como essas era sucesso de público.
Lá pelas tantas, o dito pregador prometeu que iria curar os fumantes e bebedores. Os desejosos de parar de fumar deveriam jogar seus cigarros e garrafas de bebidas na fogueira santa. Rapidamente Pedro tirou a carteira de Hudson com ponteira, de embalagem verde e jogou no fogo. Estava convicto de que estava curado e que nunca mais fumaria. Alí acabaria o desejo por um cigarro.
Outros foram chamados para queimar o pecado escrito nas revistas e jornaism que corrompiam e desencabeçavam os jovens. Alguns jogavam jornais, revistas Cruzeiro, e queimaram as escrituras do pecado como as revistas Penthouse e Playboy, além das raras revistinhas suecas e os desenhos de Zéfiro. E a fogueira aumentava, e dê-lhe discurso e reza. Uns 10 minutos depois Pedro estava arrependido do ato em busca da cura olhou para minha mãe Lili e lascou:
Sogra, me dá um cigarro. A mãe que só fumava LS King Size, olhou para ele e devolveu:
Vai lá na fogueira e pegue de volta teu maço. E deu uma risada do ato.
Mas o evento na praça tinha mais uma novidade. O tal pregador tinha uma caixa que anunciava ter uma cobra que iria revelar verdades.
Aqui tem uma mulher que é muito namoradeira. Pecadora, anda com homens casados e tem muitos namorados. Vou soltar a cobra e ela vai apontar quem é. Anunciou o paramentado.
E andava com a caixa com a cobra dentro. Caminhava pelo círculo entre o fogo que queimava cigarros, bebidas e publicações e as pessoas que faziam a volta observando e atirando no fogaréu suas pecaminações.
E veio se aproximando de nós com a ameaçadora caixa com a cobra dentro. Neste momento, eu com talvez 5 ou 6 anos, peguei na mão de uma vizinha e falei bem alto ali na praça:
Bete, Bete, vamos embora. Bete, a cobra vai te pegar. Vamos!
Só restou todos caírem na gargalhada e a vizinha Bete que era namoradeira ficou fazendo cara de paisagem como se não fosse com ela. Me larga guri! Dizia se afastando tentando se desvencilhar de mim. Depois dessa, saímos da praça e fomos para casa. Bete não ficou para ver o teste da cobra. Veio junto para casa e com passos rapidinhos. Vai que a cobra segue….
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