terça-feira, 23 de novembro de 2021

Entra aqui, entra ali, agora para

 Entra aqui, entra ali, agora para


Próximo ao natal de 2011, me ligaram da concessionária Citroen avisando que meu carro havia chegado e poderia retirá-lo na loja. Agendei para uma segunda-feira e assim o fiz. Peguei o C4 Pallas grafite deixando o antigo de cor preta como troca. Daí segui para Florianópolis, como fazia toda semana. Ia na segunda e voltava final de semana, porém às vezes seguia por toda Santa Catarina para visitar escolas, obras de novas unidades e reformas, juntamente com o secretário estadual da Educação.


Cheguei na Educação em Florianópolis lá pelas 11h, com aeronave nova e reluzente, cheirinho de novo. Na sede ali da rua João Pinto, bem no centro, como era de costume antes de subir para minha sala no 12º andar parava no 10 para uma conversa com o secretário Marco Tebaldi. Tomamos algumas cuias de mate, alinhavamos a semana e para onde iríamos. Antes de sair da sala ele me interpela. 

  • Tem que ir a Lages - balbuciou.

  • Tá bom quando vamos? questionei

  • Vai sozinho e resolva isso - me alcançando um post it amarelo. Li, refleti e não mostrei os dentes.

  • Liga para o Negão que ele te ajuda - sugeriu

Sai da sala do secretário e subi para a minha. Liguei para o Negão e avisei que no dia seguinte lá estaria que me esperasse. 


Na terça, acordei 4h, vesti uma fatiota nova de alfaiataria sob medida, camisas com monograma, coisa chic. Sai de Jurerê, onde eu morava nos dias de semana e peguei a estrada, segui rumo a Palhoça, Santo Amaro, Rancho Queimado e chegando na Janaina (posto na 282). Parei  para tomar um café preto, lavar o rosto para afastar a preguiça e seguir. Pedi o café e bebi devagar pois estava muito quente. O dono do lugar me ofereceu um suco de mirtilo, informando que era uma plantinha nova que deu certo na serra catarinense e estava dando sustento para muito agricultor. É uma frutinha roxa com alto poder antioxidante.


Reanimado segui a subida da serra até chegar no ponto de encontro com o Negão. Nas margens da BR-282 ali no Gethal, onde ele mora. De longe já vi o sujeito abagualado, com um chapéu tão grande que, com certeza era maior que os chifres de Guzerá.


Parei e o sujeito abre a porta de trás e se escarrapacha no meu carro novo, bancos de couro cheirando a novo e tapetes de camurça. O aromatizador expelia perfume francês, que vinha um com refil. Pensei,  tudo isso para ele sujar todo meu auto com botas cheias de barro.


Nos cumprimentamos e seguimos. Falei onde precisava ir e o que faria e que ele me guiasse para não perder tempo, pois queria voltar ainda no mesmo dia.


Disse que compreendeu tudo e seguimos devagar. Dai ele me manda entrar a direita. Entrei.

  • Pare aí, que eu tenho que entregar brindes para as crianças - pediu e atendi, afinal é uma causa bonita. 

E assim foi, só no Gethal cinco paradas, adentramos no Guarujá, Pisani, Conta Dinheiros, Popular, Várzea, Vila Nova e assim foi a manhã toda. Fizemos uma parada na rua das Uvaiaras no Habitação, onde morava uma irmã minha, que já faleceu.

E em cada parada eu ficava no carro, com ar condicionado ligado e ele descia, para entregar os presentinhos e fazia pose, proseava, tomava uma cachacinha e apontava para o carro e para mim. Eu, quieto pouco me viam devido a película escura. Ele voltava sentava no banco traseiro e seguiamos ao próximo local.

Eu agoniado com a situação, pois tinha de tratar dos meus assuntos. Até terno novo feito sob medida em alfaiate eu vesti. e os sapatos lustrosos, de boa qualidade que nem descia do carro para não sujar de lama.

Lá pelas tantas acabou o roteiro e disse que deveria me orientar para onde eu seguiria Afinal ele era meu cincerro. Daí ele pediu mais uma paradinha num boteco ali pelo Santa Rita. Eu só bombeando o caboclo. Meteu nos queijos um martelinho de branquinha e fez um jogo do bicho. gesticulou, apontou para o carro, deu risada e voltou.

  • E aí, acabou a andança? Vamos na minha lista? e o que você tanto dá risada e proseia com esta turma aí? Aponta para o carro e fica de falatório? questionei?

Deu uma gargalhada e disse:

  • Tebaldi não te falou nada? Ele me ajudou a comprar os presentinhos e garantiu que ia me mandar um motorista de terno para me levar nas entregas. A lista tua é falsa e em cada boteco desses eu falei que você era meu chofer que em mandei vir lá da minha fazenda do Paraná onde crio pinhão. E o auto novo, nem placa tem, tirei ali na concessionária agora de manhã. E falei com você é um ex-caminhoneiro de São Marcos que estava matando cachorro a grito lá em Vacaria e eu te trouxe para te dar um ajutório.

Restou- me dar uma sonora risada, largar o abagualado na beira da 282 no Gethal e voltar para Jurerê e ter uma boa noite de sono.


E como é domingo de Páscoa, que Deus os proteja. Me vou despacito que meu mate está pronto, cheio de carqueja para limpar o vivente.


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